Seguidores

quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

Vulcão Lascar, expedição 230-A

Sem qualquer pretensão de ser melhor, apenas viver seus sonhos e atingir seus objetivos, a  "Expedição 230-A" passou duas semanas no Chile e na Argentina. Santiago, Calama, San Pedro de Atacama,  Toconao, Talabre,  San José del Maipo, Penitentes, Puente del Inca, Las Cuevas...

Com direito a deserto esculpido por deuses, montanhas altíssimas, vulcão ativo, lagunas "flutuantes",   asfalto, ripio,  vicunhas, lhamas, lobos, flamingos,geysers, águas termais,  nevados, vinícolas,  neve, caverna, estrelas,  gelo,  muito calor, muito frio, muito vento e muito vinho -- bom e barato..

Falar do céu sempre azul e da beleza  inigualável do por do sol no deserto do Atacama é redundância. E a  superlua cheia brotando ao lado do  Vulcão Licancabur?   Inesquecível!

Pra fechar com chave e susto de ouro,  no domingo, dia 20, 18h, um terremoto de 6.4º na escala Richter, na Argentina. Portanto,  aventura e emoção pra dar e vender.

Um dos pontos altos da viagem  foi a ascensão do temido Vulcão Lascar,  a 150km da pequena San Pedro de Atacama,  nosso quartel-general e de onde sua fumarola pode ser vista, especialmente pela manhã.

Mais belo, mais próximo, onipresente, inativo, inofensivo e  imponente, o Licancabur (5.950m), "vulcão do povo de cima" exige pelo menos dois dias de atividades intensas. Quem sabe na próxima!

Última erupção mais representativa  do Lascar -- língua  e fogo ou cortada no dialeto quéchua --  aconteceu em abril de 2006 e  sua fumaça chegou ao  Brasil. São 5.592m de altitude até o cume. A cratera fumegante, um pouco abaixo, tem 750m de diâmetro e 300m de profundidade.

Depois de quase cinco dias de adaptação  ao clima e à altitude, com inúmeros passeios, cansativos mas fabulosos,  chegamos ao ponto culminante na sexta-feira, dia 18 de novembro último.

Tudo pronto! Véspera sem exageros alimentares nem alcoólicos. Só chá de coca. Também sem excessos. Não precisa tanto. Cria dependência desnecessária para a maioria.

Roupas adequadas em três camadas sobrepostas, meias especiais,  luvas, gorro, bota de trilha, bandana, óculos escuros, soro fisiológico, colírio, protetor solar e sticks pra auxiliar na dura caminhada com aclive  bem acentuado. Tubinho de oxigênio ficou na mochila. Sem uso.

Com cara e  coragem,  companheirismo, bom preparo físico e psicológico, também  levamos bastante água, castanhas, chocolates, gel e barrinha de cereais. Tudo sem muito peso na mochila. Consumimos pouco.

Saímos às 7h da manhã do Holiday House Atacama Soleil.  Locação da casa do francês nota 10 Phillipe e da  doce atacamenha Viviana foi um achado, impecável, inesquecível. Nosso muitíssimo obrigado a ambos.

Com apoio da tecnologia --  GPS, Google Maps,  Wikiloc -- nossa  Hilux 4x4 vermelha, alugada no aeroporto de Calama, encarou um verdadeiro rali.

Asfalto, terra e depois muito  ripio; solavancos  intermináveis em costelas até a  bela Laguna Lejia, onde entramos  à esquerda e  atravessamos um  trecho de deserto repleto de marcas de pneu.

Mas o mapa de estradas e trilhas foi preciso. Por isso, embora reconheçamos importância e  profissionalismo, dispensamos guia e agências, com custos nem sempre ao alcance de todos.

Paramos no sopé do doce monstro, parceiro do Vulcão Águas Calientes (também chamado Simbad), que fica ao lado, é um pouco mais alto ( 5.924m) e gera confusões. Especialmente naquelas  lindas fotos de divulgação tiradas ao lado da laguna.

Demos sorte. Céu claro, limpo,   frio suportável, pouco vento e trilha bem marcada,  em zig-zag.  Sinceramente, não havia como errar. Guia não é imprescindível, se estivermos preparados e se o tempo ajudar.

Começamos a maratona às 9h. Inclinação assustadora. Terreno difícil.  Arenoso e com pedriscos deslizantes. Passos não rendem.  Os pés afundam. Por isso a importância dos bastões de caminhada.

Primeiros 30 minutos são cruciais.  Não adianta forçar. Extremamente cansativos. Cheguei a pensar que estava indo para o inferno, não para a cratera. Como dizem que o inferno é pra baixo, continuei subindo.  Coração de atleta (veterano) saltitante.

Segredo é subir ao passo, como ensinou nosso guia Amoroso, na travessia Salkantay/ Machu Picchu,  Peru. Quase 5 mil metros, ar rarefeito. O bicho pegou! Optei por ditar o ritmo em 80 passos. Subi pra 100, voltei para 80, 60, 50 e cheguei nos 30 no final do primeiro terço do desafio.

Depois,  mais adaptado, focado  e sempre bem hidratado, optei pelo número mágico: 80 mini passos, descanso estratégico "para ver a  linda paisagem", sem sentar,  e um pouco de água a cada 15/20 minutos. Foi uma boa. Sobrevivi com certo louvor, sem dores nem temores.

Superados os  malditos falsos cumes, segundo e terceiro terços foram engolidos sem tantos transtornos. Confiança, otimismo, nada de incômodos musculares insuperáveis e sem transtornos com a altitude, cada vez mais significativa.

Chegamos à cratera, e não ao inferno,  em 2horas e 45min. Cheiro de enxofre não chegou a incomodar tanto.  Uma visão extraordinária. Um paraíso repartido com outros dois grupos, com dois guias e mais seis corajosos .

Extenuadas mas recompensadas, Marilene e Angela ficaram na boca da cratera conversando com uma brasileira. Eu e o Milton  conversamos, calculamos e encaramos o cume confiantes.

O guia do casal brasileiro falou em mais 50 minutos pra subir e uns 20 pra descer.  Subimos em 33min e descemos em 10min. Sem medo, com sticks  e pernas mais abertas. E sem freio. Caí de bunda numa pedra mas o Milton nem viu. Por isso não riu.

Mochilas leves nas costas, aceleramos um pouco na descida  da cratera, mas não conseguimos alcançar as esposas, que "fugiram" enquanto estávamos no cume,  onde gritei, agradeci a Deus e  orei junto ao pequeno cruzeiro e uma mini-estação meteorológica -- pelo menos deduzi por causa dos fios.

Contando com a via de emergência --  aquela para caminhões em declives acentuados --, por nós apelidada de "caixa de brita",  soltamos os freios. Por sorte, deu tudo certo. Os joelhos operados reclamaram um pouco,  mas suportaram com louvor. Sem falar que já tive duas tromboses.

Um tombinho aqui outro ali é inevitável. Faz parte.  Mesmo porque, cortamos caminho, agora optando pela trilha em linha reta. Porém, é preciso não querer descansar sentando. E também não se levantar rapidamente quando beijar o chão. Aí a pressão cai e a tontura é inevitável.

Uma hora depois, quando chegamos no carro, as duas já estavam acomodadas. Mesmo porque, eram mais de duas da tarde e o vento cortante  agora começava a judiar. Ainda bem que não nos pegou na montanha.

Nariz escorrendo e  certa dor de cabeça  também  compõem o pacote vulcânico por causa da descompressão. Descer muito rápido não é bom negócio. Nem sempre na descida todo santo ajuda.

Cansados, mas extremamente felizes pela conquista, pegamos a estrada de volta. Com a certeza de que o Lascar  merece  muito respeito mas não é nenhum bicho-de-sete-cabeças.

Um desafio, uma conquista, um abraço. Afinal, somos amigos da montanha.

 À noite, aquele jantar festivo, regado a um belo vinho chileno com queijo de primeira.  Sem contar o delicioso churrasco de despedida do nosso anfitrião nota 10.

Sem falsa modéstia, merecemos! Coisa de loucos ou gente grande;  não é pra qualquer cristão não.

A  vitoriosa expedição 230-A acabava de atingir mais uma meta. Só pra lembrar: somos três aventureiros  amadores e sonhadores com 61 anos de idade e um com 47. Na soma, dá 230.

E já estamos  pensando  na próxima. Assim meus  cinco netos poderão ouvir e curtir mais  causos e histórias vividas pelo vô babão. Quem  sabe as lendas dos quase 7 mil metros do Aconcágua, o topo da América?

Só pra não passar batido: na semana seguinte ao Lascar chegamos bem pertinho de Confluência/ Acampamento Base  do Aconcágua na visita ao parque argentino. Ficamos em Penitentes/Puente del Inca, nas barbas do terremoto de San Juan, com epicentro a mais de 100km de profundidade.

Sei que o Aconcágua é muito  difícil. Desafio pra pelo menos 15 dias e gente experiente no ramo. Vou amadurecer a ideia. Afinal, nada é impossível enquanto temos a ousadia de sonhar e a coragem de tentar.

2 comentários:

  1. Sonhar para concretizar.. rumo ao Aconcágua... Parabéns por mais uma conquista Paizão..
    Meu eterno atleta e herói.
    Bjs

    ResponderExcluir
  2. Obrigado filha. Tenho muito orgulho de você. Te amo.

    ResponderExcluir