Aqui vai um breve relato da desafiadora travessia Marins x Itaguaré. Nada de três dias, o mais correto, prudente e tradicional. De novo sob a batuta do Leo (Araucária Expedições) e em companhia do genro/filho Danilo, o objetivo era fazer em um dia. Light/fast -- leve e rápido.
Desta vez sem muita preocupação com contemplações demoradas. Nem os pit stops foram superiores a 15 minutos. Tudo pra ganhar tempo e treinar forte pra novos desafios.
Nossa mochila de 20/30 litros não carregava mais que seis quilos, já considerando os 2,5/3kg de água e Gatorade, dois lanches de salaminho e queijo, chocolate, mel, castanha, damasco e carb up, além de boné, lanterna de cabeça, stick e apenas peças essenciais de frio. Corta-vento, fleece, camiseta segunda pele e calça de trilha pra proteger dos bambuzinhos cortantes -- fui vítima quando teimei em ficar de bermuda por sentir calor, me enrosquei e o sangue escorreu pela canela.
Sem dúvida, ir leve foi uma boa escolha pra quem quer jogar pesado, revisitando Agulhas Negras ou conhecendo a Pedra do Frade. Ganho de elevação aproximado superior a 1600m, pouco mais do que o somatório de perdas.
Pra superar 18km -- distância/referência secundária perto da altimetria e demais dificuldades físicas e técnicas -- foram exatas 12 horas de pauleira, com um trepa-pedra constante, assustadoramente constante e desgastante. Exceção às duas horas finais, quando a descida pela trilha de pouca pedra e muita terra mata adentro não terminava nunca.
TREPA-PEDRA SEM FIM
Viajamos no dia 10 à tarde e dormimos em Passa Quatro, no Hostel Serra Fina, do jovem Felipe, amigo do Leo. Tudo simples e a contento, com preço justo. Sono de cinco horas ( das 23h até as 4h) foi o suficiente até pra mim, que gosto de dormir 8 horas.
Café tomado, estômago forrado, dente escovado, bota calçada, lá vamos nós, às 4h30min. Não sem antes o Danilo observar que o teto do seu carro estava com gelo. Também, pudera, cerca de zero grau na madrugada.
Demoramos uma hora pra vencer a estrada de terra e chegar ao "estacionamento" no final/início da trilha que leva ou traz do Pico do Itaguaré.
Lá já nos esperava o possante Uno do seu Clóvis, conduzido pelo Maurício. Um piloto de Marmelópolis para o mundo. E acelera! Maurício Senna do Brasil, diria o intragável Galvão Bueno. O cara é fera viu! Ou louco! PQP! E nós corajosos PC!.
Chegamos ao acampamento base do Marins ( município de Cruzeiro) pouco antes das 5h30min, pagamos o transfer atômico e em menos de 10 minutos já estávamos iniciando a trilha no patamar de 1530m. Num pique danado, diga-se. (O que não me impediu de, na primeira grota, ouvir o pio protetor do meu inseparável nhambu amigo). Até pensei em perguntar pro Leo se queria matar o veinho ou fundir o motor do trator 6.4.
Os dois abriram o turbo; eu abri o bico... logo de cara. Tanto que chegamos ao primeiro pit stop -- ou stop and go? --, o Morro do Careca, 1800m, em cerca de 45min. De cara, uma bela visão do amanhecer, com sol, nevoeiro e muito verde.
No segundo mirante, um colchão de nuvens brancas, aquela imensidão iluminada... um mar de montanhas de Minas Gerais. Aquela... que quem te conhece não esquece jamais. Mais fotos e menos roupa. Temperatura inicial de 3° já beirava os 8°. Presumo.
Em ritmo um pouco mais conservador, superamos vales, vários sobe-e-desce, inúmeros trepa-pedras difíceis, um paredão vertical de uns seis metros e chegamos ao Pico dos Marins, 2.430m, depois de 3 horas e 15 minutos de caminhada tão extenuante quanto gratificante.
Ah, também superamos a falta de educação de pseudomontanhistas que fazem necessidades nas áreas de acampamento e ainda espalham sujeira pela trilha. Um absurdo! Questão de berço.
Subida da base ao pico dos Marins não é mole não! Exige escalaminhadas e alguma técnica. Do acampamento base ao cume, aclive acentuado e muita laje de pedra, testando força, resistência, equilíbrio, flexibilidade, respiração, determinação, joelhos, quadril e lombar. Lá no alto, depois do lanche merecido, aquelas fotos tradicionais e bora assinar o livro de cume. Tudo nos conformes!
Visual exuberante de grande parte das cidades do Vale do Paraíba. E com direito a Itaguaré de frente e Pedra da Mina mais ao fundo. Deu saudade!

Itaguaré com Pedra da Mina ao fundo
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Sonhando com trepa-pedra até hoje |
MARINZINHO, PEDRA REDONDA E ITAGUARÉ
As 10h em ponto iniciamos a descida do Marins. Só fomos chegar à base do Itaguaré às 16h15min. Depois de superarmos os 2.350m do Marinzinho ( bom ponto de reposição de água quase na base e o melhor lugar pra quem precisa abortar a travessia e descer para a pousada Maeda); e em seguida a Pedra Redonda, que está em 2.300m e mais parece um enorme tóten com linhas retas. Sim, retas.
Ah, também deixamos pra trás inúmeros aclives e declives, verdadeiros mergulhos sem água, que em alguns momentos exigiram cordas, determinação e extremo cuidado para evitar acidentes. Especialmente quando se fica exposto nas alturas. Resumindo: a cada descida vertical cavalar, uma ascensão agressiva, chocante.
Cerca de 80m finais pra se chegar ao verdadeiro cume do Itaguaré (Pedra Sagrada, com 2315m) não é coisa para juvenil não! Pedras grandes e sem apoios confiáveis, mais escalaminhadas, angulação significativa, falso cume, corda, precipício, elevador manual do guia, pulo do gato na volta e outros sacrifícios. Ah... perto da base também tem água saudável, mas usamos clorin por precaução.
Fotos feitas de forma acelerada. Só faltava assinar o livro do cume. Mas cadê o livro? Não estava na caixa de metal. Acho que o guardião -- seria o meu amigo Guto, o guia nota 10? -- levou e ninguém repôs. Paciência! Sem problema.
O que vale é a conquista. A sensação de quão nos sentimos gigantes ao chegar e o quão nos sentimos um grão de areia ao olharmos ao redor e observarmos a grandeza da natureza. Sim! É a mão de Deus, como diz o Gutão.
Iniciamos o mergulho final por volta das 16h45min. Laje de pedra bem inclinada merece atenção especial. Se escorregar ou tropeçar, o tombo vai ser federal. Em 30 minutos, sob o testemunho do por do sol alaranjado, adentramos a mata.
Uma ribanceira interminável! Principalmente pra quem já caminhou mais de 10 horas, está no limite físico e psicológico, e ainda precisa se preocupar com tropeções nas raízes expostas. Se perder a concentração o destino é o chão.
Meia hora derradeira, já com lanterna de cabeça devido à escuridão, é menos traumática. Terreno mais plaino, beirando os riachos, favorece. Danilo abre o lacre do turbo e acelera. Não demoramos pra chegar. Cansados, sãos, salvos e muito contentes.
Deu tudo certo. E a natureza nos premiou com uma beleza incomum. Chegamos quebrados, mas extremamente felizes. Lá estava o carro como deixamos. Brindamos com uma garrafinha de Pati -- pinga, gengibre, mel e limão. O vinho tomamos em casa, com a família. Afinal, merecemos.
Obrigado Danilo! Obrigado Leo! Obrigado Senhor.
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Lindo por do sol na interminável descida do Itaguaré |
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Um trator 6.4 no pico do Itaguaré... rsrs |
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Danilo e Leo no Pico dos Marins |
Oi Raddi! Tudo bem?! Que legal! Esteve na minha terrinha...Muito bom! O Marins é sensacional né?! Desafiador, mas sensacional... Um Abraço Pra Vc!
ResponderExcluirOlá Mara! Tudo ótimo! Verdade.Travessia desafiadora e maravilhosa mesmo. 12 horas de pauleira que valem a pena. E vou voltar. Adoro Serra Fina e cia. Grande abraço pra vc tb.
ResponderExcluirObrigada! Legal!!! Volte sim! Quero fazer a trilha do ouro no final do ano, vamos ver... :)
ExcluirVai adorar. Só tome cuidado com o mau tempo depois de outubro. Aí complica. Boa sorte.
ExcluirVerdade! Complica mesmo! Obrigada!
ExcluirParabéns por mais esta conquista!!!
ResponderExcluirSua determinação é admirável.
Que venham outras travessias e acompanhadas de belos relatos.
Um grande abraço.
Olá...bom dia. Muitíssimo obrigado pelas palavras. Valeu pelo incentivo.
ResponderExcluirRadão, sou eu que tenho que agradecer a oportunidade de vivenciar a travessia... para mim o trajeto foi a representação resumida da nossa vida....como sobe e desce desafiadores....beleza, tristeza, força, cansaço, medo, coragem (que vem bem de dentro), mas principalmente resiliência.....demonstração clara que tudo tem começo, meio e fim.....nos cabe escolher as trilhas certas....obs: a propósito o Léo está devendo 60 solis...kkkk...
ResponderExcluirVamos para a próxima!
Abração
GRANDE DANILO! VALEU MESMO!QUE VENHAM NOVOS DESAFIOS. JUNTOS, SEMPRE SEREMOS MAIS FORTES.
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