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quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Tulica, um gol impossível!

Ronaldo; Roberto Correa, Rodolfo, Flávio e Luiz Augusto; Fernandinho, Souza e Vicente Cruz; Celso Motta, Tulica e Romolo. Técnico: Aurélio Loureiro Bastos.

Poucos se lembram, mas esse timão comandado pelo seu Aurélio derrotou o Grêmio Catanduvense por 2 a 0 num Bruno Daniel lotado -- seis mil pessoas nas arquibancadas ontem cobertas, hoje desprezadas -- e foi campeão.

Só que na Divisão Intermediária de 75 não houve acesso. A conquista foi festejada mas se tornou inócua. De nada valeram os gols do rio-pardense Souza e de um centroavante canhoto, metido a artilheiro.

O mesmo que no ano seguinte, em junho, no Jaçatuba -- estavam a construir a arquibancada descoberta do Brunão -- ajudou o Ramalhão a aplicar a maior goleada de sua história.

Os 8 a 0 sobre o pobre Amparo aconteceram numa noite fria, com uma sensação térmica gélida por causa do vento. Está certo que no jogo do returno, sob muita chuva, o Santo André de Sebastião Lapola subiu no salto, foi displicente e apanhou de 3 a 0.

Mas o jogo que me interessa mesmo é do turno, do ainda gelado morro dos ventos uivantes, hoje um belo poliesportivo comandado por Celso Luiz de Almeida.

Meu amigo Romolo nem se lembra, mas fez dois gols. Celso Motta, um ponta/centroavante rápido que me dava muito trabalho nos treinos de 73, também marcou.

Outro a marcar foi Vicente Cruz, que em 73, cabeludo e de fitinha, era reserva do time reserva. Além de capitão do Juvenil, eu era titular dos reservas -- deu pra entender? -- e o Viça acabara de chegar pelas mãos de Nascimento, um ponta-esquerda criado no Corinthians.

Romolo era operário incansável, voluntarioso, ajudava o meio-campo e ainda chegava para finalizar com eficácia. Nascimento era de partir pra cima. Lembrava aquele Edu, do Santos e da Seleção Brasileira. Como zagueiro de área, cansei de sair pra cobertura e levar cansaço dos dois.

Pois é... Voltemos ao corpo. Faltam quatro gols. Quatro gols de um menino grande, artilheiro, chamado Alberto. Alberto Soares de Araújo. Seu apelido? Tulica.

Não tenho certeza e o Romolinho não se lembrava nem que fez dois gols, mas meu amigo Jurandir Martins, um dos maiores jornalistas e historiadores do esporte do Grande ABC, garante que não foram quatro de cabeça.

Também, não é o primordial. A essência é dizer que Tulica fez quatro dos 63 gols que marcou com a camisa do Ramalhão. Ainda é o maior artilheiro da história andreense.

Assim como deve ter sido o maior do Grêmio Mauaense, clube ao qual levou ao título e ao acesso e onde encerrou carreira. Aos sábados à tarde, o campo de terra batida do Cerâmica sempre foi o palco principal de gols memoráveis.

Quando o companheiro Saulo Leite chegava na redação do DGABC, ouvia, inevitavelmente, duas perguntas, minhas ou do Daniel Lima: " E aí Saulinho, quanto foi? Quantos gols do Tulica?"

Não vou me lembrar de todos, mas sei que Tulica começou a brilhar pelas mãos do técnico Roberto Bonora e do dirigente José Vicente Guerra, em 70. Naquela época o esporte de Santo André era respeitado e campeão dos Jogos Abertos do Interior. Hoje...

O time campeão de futebol em Bauru tinha ainda o Ademir e o Romolo, entre outros que acabaram ganhando oportunidade no Santo André. Romolo e Tulica brilharam; outros, nem tanto. Ademir brilhou em Portugal.

Tulica foi pro Santos, Atlético de Carazinhos (RS), Juventude, e voltou para casa em 74, quando foi vice da Segundona. Também cansou de fazer gols de tudo quanto é jeito por Atlético Goianiense e depois Vila Nova.

Em Goiás, recebeu o título de maior artilheiro do Serra Dourada jogando pelo Vila. Era mais respeitado do que Baltazar, o artilheiro de Deus e que fez tanto sucesso por Grêmio e Palmeiras.

Alberto Soares de Araújo era conhecido como Artilheiro do Fantástico. De tantos gols bonitos apresentados na Globo, em horário nobre, acabou contratado pelo Fluminense, onde, dizem, viveu mais de más companhias noturnas do que de gols.

Pois é, Tulica, seus belos gols ainda estão na minha retina extremamente seletiva. Na minha e na de todos aqueles torcedores que se cansaram de tanto admirá-lo e aplaudi-lo.

Você não era centroavante apenas trombador, caneleiro, de fazer gol feio, sem querer. Lógico que os fez, mas eram raros. E importantes, por que não?

Cada gol! O pé esquerdo era mortal. Com um tapinha, de chapa ou uma bambuzada indefensável. A cabeçada era fatal, um chute. Quantos gols de cabeça maravilhosos. Me lembro de um de fora da área, contra o Paulista de Jundiaí.

Pois é, Tulica, ainda outro dia, lá na Jocker -- a loja de som e cia do meu filho mais velho, o Fábio --, conversamos sobre a vida, sobre os gols, sobre as glórias, sobre perdas e danos de quem jamais se cuidou como deveria e já vivia de lembranças.

Ainda brinquei, ironizei, sobre sua matada no peito. Você sorriu, abriu os longos braços e simulou a morte da bola. Mal sabem, os que não o viram jogar, que você não a matava. Mais do que isso, você a aninhava, a escondia, de tal forma que o zagueiro não tinha o quê fazer.

Quanto não, dominava conduzindo-a pro lado que queria, o bom, fazendo a parede no zagueirão, e mandava o pé. Becão não tinha vida fácil diante do artilheiro.

Artilheiro que, vítima de diabetes, alimentação inadequada, álcool, solidão e más companhias -- alguns falsos fãs do sucesso efêmero que enebria o ídolo -- nos deixou para sempre.

Tulica já não tinha pernas para driblar a morte. Tulica já não tinha reflexos para agasalhar a bola com carinho e arte. Tulica já não tinha impulsão para o último cabeceio. Tulica já não tinha forças e visão para o último pivô, o último giro, o último gol. Um gol impossível!

Com certeza, o torcedor jamais o esquecerá. Como os amigos de verdade e o Esporte Clube Santo André, que sempre que possível lhe estenderam a mão. Independente das imperfeições, da glória e dos meteóricos gols globais.

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