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segunda-feira, 21 de setembro de 2020

Travessia Rancho Caído, um exercício de gratidão













Aos poucos, bem devagarinho, e cumprindo quase à risca todos os protocolos sanitários impostos pelo Covid-19,  vamos voltando às montanhas da vida, ao aconchego da mãe natureza. Afinal, ninguém é de ferro! Nem meu barracão polivalente me aguenta mais!

Marinsinho,  morros de São Bento do Sapucaí,  base da Pedra do Baú e agora a Travessia Rancho Caído. Na realidade, originalmente, a travessia no Parque Nacional de Itatiaia se chama Rebouças x Mauá, pois ia do Abrigo Rebouças até Visconde de Mauá, distrito de Resende-RJ. 

Do posto Marcão,  via  circuito 5 Lagos, até a cachoeira do Escorrega/Maromba, são  cerca de 22 quilômetros, cumpridos com louvor em pouco mais de nove horas.  Nove horas de beleza, sol e céu azul. Nove horas de respeito e  companheirismo. Nove horas de humildade e  gratidão.

Desafio altimétrico envolve mais  de 1650 metros de perda de elevação acumulada e perto de  apenas 680 metros de ganho. Portanto, muita descida e pouca subida, com pequenas alternâncias de relevo. Na portaria estamos a 2450m de altitude, enquanto que na cachoeira  do Escorrega são mais ou menos 1300m. 

Vereda bem demarcada, piso sem tantos obstáculos. Tampouco escalaminhada ou qualquer dificuldade  muito técnica, com exigência de equipamentos essenciais em outras situações.

Mais prudente, e coerente, é fazê-la em dois dias, privilegiando ritmo,  cuidados e contemplação e  montando acampamento onde antigamente existia um rancho caído. Porém, desta vez, nosso objetivo era mesmo o chamado light/fast, caminhando mais leve e mais rápido. 

Bom ressaltar, também, que, devido à pandemia,  ainda está proibido acampar no parque. Portanto, quem tiver peito faz em um dia.

Se foi cansativo? Foi! Pra fazer sem pernoite a dificuldade da trilha pode ser considerada de moderada a difícil. Em dois dias, basta gostar e estar bem condicionado que o aventureiro consegue sem maiores traumas.   Não vai chegar quebrado. Se for fracote, cheio de mimimi, melhor ficar em casa comendo pipoca. Vai dar trabalho/vexame e prejudicar o grupo. 





Após   nossa kombi vencer 13km de uma estrada de terra esburacada e mal conservada até a portaria da parte alta do PNI, apresentamos os ingressos  gratuitos -- mais de 60 anos -- via celular e começamos nossa maravilhosa  jornada às 7h40min. 

Poucos metros depois  a placa já indica o sentido dos 5 Lagos, à esquerda. Uma subida razoável, que faz a pulsação acelerar um pouco. Afinal, estamos no início da atividade física e o aquecimento foi desprezado. Falha minha! Casa de ferreiro, espeto de pau!

Não demoramos muito pra atingir um grande  bloco de pedras chamado plano inclinado, que deve ser superado com atenção e extremo cuidado. Especialmente se o tempo estiver chuvoso. O que não foi nosso caso, já que pegamos céu azul de cabo a rabo e temperatura entre 13 e 27 graus, aproximadamente. 

Com vistas de tirar o chapéu, nem vimos o tempo passar. Não demorou pra nossos olhos brilharem e nossos corações se encantarem. Pedra do Altar (2665m), Asa de Hermes, Agulhas Negras -- nossa primeira ascensão ao pico de 2491m foi em 2003 -- e muita beleza. Basta ter sensibilidade e prestar atenção ao seu redor.


Samantha, Giovanna, Aninha, Vitor, Camila, Raddi e Angela
 
Papo vai, papo vem, vamos nos identificando mais com o Renato, que fechava a fila e também é professor de Educação Física, como eu e a Angela. Gente boa, lógico! 

Passamos pelo vale do Aiuruoca já avistando os Ovos da Galinha e a Pedra do Sino à direita e depois fizemos um pit-stop na cachoeira do Aiuruoca. 

Descansados, alimentados e hidratados,  atravessamos o rio sem dificuldade -- pouca água em tempos de secas e queimadas -- e seguimos em frente. 

Sem demora, chegamos a 100m dos Ovos da Galinha e do acesso à Pedra do Sino -- extra-oficialmente, o 10° pico mais alto do País com 2670m. Vitor, o grande guia, até perguntou se queríamos ir mais  próximos pra fazer fotos, mas não nos aventuramos. O galo caipira é bravo e tem esporas afiadas.  E o padre é da pá virada; pode bater o sino na hora errada ( Pedra do Sino ainda estava interditada por ordem do governo mineiro e poderíamos ser multados...(rsrs).  Melhor voltar outro dia.

Sem qualquer senão ou problema mais significativo,  passamos pelas costas de Agulhas, no Vale dos Dinossauros, se não me engano, pegamos uma descidinha, superamos um riacho e por volta das 13h já estávamos no espaço do Rancho Caído. 

Hora de descanso prolongado e  lanche reforçado. À sombra, pés descalços, camisetas e meias trocadas, bora tomar água, gatorade e comer salamitos, pão com queijo, castanhas, polenguinho, geleia de mocotó, gominha doce e tudo mais que ajude a cumprir o desafio.












AGULHINHA,COM
AGULHÃO AO FUNDO









                                            MATA-CAVALO, FLORESTA E ESCORREGA 

Em pouco tempo ganhamos a companhia momentânea de três jovens guiados pelo conhecido Levy. Depois de alguma conversa, partimos para a segunda perna da jornada,  por volta das 13h40min13seg, com previsão de chegada entre 16h30min e 17h. 

Sempre sob a orientação firme, discreta e serena do Grande Guia, logo pegamos uma subidinha e depois o último adeus aos costados de Agulhas Negras.   Antes com direito a fotos na Agulhinha, pedra clara que  lembra a parte frontal  do Agulhão. 

Sabe aquele olhar de gratidão a Deus por nos premiar com saude e  tamanha beleza? Então, foi assim que olhei pra Agulhas e fiquei pra trás sem querer partir. Juro que se ali ficasse, pra sempre, morreria feliz.

Mas não fiquei!  Deu saudade dos quatro filhos  e dos sete netos. Aceleramos o passo e alcançamos as meninas e o Vitor,  dando início à difícil mas não tão desgastante descida do Mata-Cavalo. Agora sob o testemunho do Pico do Maromba e do Marombinha, já podíamos enxergar nosso destino, lá embaixo, muito longe. Do mirante também avistamos Visconde de Mauá e a Pedra Selada.

Por sorte, o Mata-Cavalo não é mata-burro. Meus amigos do peito e meu querido irmão, Moisés, diriam que eu não conseguiria passar. Pura maldade amiga! Piada de mau gosto, mas perdoável. Assim, o fardo da vida fica mais leve. 

Também por sorte, o início do aparente precipício contempla zigue-zagues e cotovelos salvadores. Basta ir com cuidado, usar os sticks com destreza e saber onde e como pisa.  Não escorregar sem estar na Cachoeira do Escorrega é quase impossível.  Não pode perder o foco. Tornozelos, joelhos, quadril e lombar agradecem se você não fizer besteira. 

Pouco depois das 15h, sempre descendo,  adentramos no bosque. E a sombra foi providencial, salvadora. Cansaço já começava a dar o ar da graça e cuidados deveriam ser redobrados. Ainda conversávamos, mas agora nem tanto. Sobrava assunto. Faltava fôlego.

"Vitor, tá chegando?", eu gritava em tom de brincadeira lá do fim da fila. Nada de resposta ou palavra convincente. Apenas um discreto sorriso de quem quer dizer "falta pouco, mas tá meio longue ainda".

Gosto muito da mata mais fechada -- lembranças de um pré-adolescente que caçava  pomba e nhambu com o pai, o saudoso seu Valério,  nos  grotões das fazendas Boa Esperança e Belo Horizonte -- mas a rotina final acaba ficando cansativa. Parece que não chega nunca!

Mas, finalmente,  chegamos! Todos inteiros! Na casa dos guardas, às  16h42min13seg,  não havia ninguém  pra dar baixa confirmando nossa saída do parque. Paciência, mais 10 minutinhos e lá estávamos na famosa Cachoeira do Escorrega. 

Ninguém se aventurou! Todos procuraram a kombi do Marcelo, exemplar de educação, pontualidade e de direção defensiva, não nos colocando em risco em momento algum. Tanto na ida de Resende/Penedo até o posto,  como na volta, pela perigosa, cheia de curvas e  igualmente mal-cuidada estrada de Visconde de Mauá até Penedo. 

Assim como na ligação da Garganta do Registro -- divisa dos estados de Minas e Rio -- até o posto Marcão, mais um exemplo de desleixo, de descaso com as necessidades da população. Uma  vergonha para autoridades mais preocupadas com o próprio umbigo, também conhecido como bolso. 

Mas... assim é o Brasil de hoje. E assim continuará amanhã se não colocarmos a boca no trombone, denunciando mazelas espalhadas pelos quatro cantos do país. 

Assim foi nossa jornada na bela travessia do Rancho Caído. De cair o queixo. De lavar a alma. De enxugar lágrimas. De liberar emoções. De agradecer a Deus por tamanho privilégio. Ele nos brindou com mais uma obra prima, um pedaço do paraíso.

Obrigado meu amigo, Grande Guia. Parabéns e  obrigado Angela, Renato, Samantha, Giovanna, Camila, Aninha e Marcelo,  pelo companheirismo incondicional. Valeu, galera! Prontos pra próxima.     

   



























GRANDE GUIA... GRATIDÃO

2 comentários:

  1. GRATIDÃO �� É dizer obrigado com a alma! Proteção à todos nas próximas travessias. Excelente blog, parabéns pelos riquíssimos relatos. Deus te abençoe e te guarde ��

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  2. BELAS PALAVRAS...MUITÍSSIMO OBRIGADO...DEUS TE PROTEJA...SEMPRE

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