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segunda-feira, 16 de julho de 2012

25 km de parques, cinemas e doces lembranças

Pode parecer loucura, mas boa parte do domingo deste caipira e da esposa e companheira de viagem, Angela, foi de parques, cinemas e doces lembranças.
Tudo em 25km de caminhadas, amparadas por água de coco, castanha do pará, polenguinho e chocolate.

A começar pela rua Santo André, onde moramos. Por volta das 9h30min, descemos a Abílio Soares, cortamos a avenida exatamente onde era o antigo restaurante Napolitano, defronte ao Cine Santo André, na Alfredo Fláquer, e saímos na Gertrudes de Lima.

Primeira parada mais demorada para lembrar da história foi ali, bem atrás do antigo Cine Teatro Carlos Gomes. O primeiro (com 804 lugares) deu lugar à avenida Perimetral; o segundo (1.400 lugares) está infestado de desrespeito à beleza histórica.

De cinema, não tem mais nada. Dos fundos se enxergam andaimes e até a rua Senador Fláquer. Parece um esqueleto. São quatro paredes e nada mais, além de lembranças de uma adolescência vivida num dos cinemas mais antigos do Brasil. O que havia de patrimônio histórico a ser tombado e preservado está avirando saudade. Infelizmente!

Lamentamos o triste fim e seguimos "viagem". Afinal, nossa proposta era fazer o que denominamos Circuito dos 4 Parques (e quatro cinemas?). Senador Fláquer vazia e Oliveira Lima idem.

Pouquíssimas pessoas, mau cheiro e muita sujeira. Lá embaixo, quase na linha do trem, o saudoso Cine Tangará, que já comportou 3089 espectadores. Virou templo, igreja, salão ou coisa do gênero. Não muda muito. Ninguém escapa do dízimo.

Portas abertas e aquelas cadeiras antigas nos fizeram relembrar das matinês, das tardes de domingo; de namoros escondidos e beijos proibidos. Isso quando o maldito "lanterninha" não chegava. O senhor do flagra não dava moleza.

Sorrimos e picamos a mula, em passo acelerado. Antes de atravessar a passarela para ganhar o outro lado da linha, paramos quando a memória retrocedeu e captou a velha cancela. Antigamente, o "sino" tocava quando o trem se aproximava, a cancela descia e, de mala e cuia, o povão esperava, já sem tanta paciência.

Passarela superada, passamos defronte à antiga e famosa Rhodia de tantos empregos que se foram e poucos postos que se preservaram. Sobre o muro, deu pra ver os enormes galpões, as amplas alamedas e os gramados ainda bem cuidados.

Mas o odor de produtos químicos continua insuportável. Chega a irritar os olhos. Tanto quanto o do rio Tamanduateí, que atravessamos antes de subir a rua e chegar ao Parque Regional da Criança.

Fincado no Jaçatuba, o nosso P-1 está bem cuidado. Como sempre, e em todos os parques, os guardas municipais estavam de braços cruzados, jogando conversa fora ou falando ao celular. E olha que estava frio, viu! Custava andar um pouco?

Bem cuidada e com pedriscos, pista de caminhadas e corridas tinha poucas pessoas se exercitando. Bem diferente da academia ao ar livre, com vários aparelhos ocupados e apenas dois ( os de sempre) interditados. Quadra de tênis tinha pelo menos quatro candidatos na fila de espera.

Parque infantil estava recheado de ferinhas, com preferência por escorregadores, túneis, gira-giras, labirinto e muita areia. No campinho de futebol, de terra, rolava um 4x4 mirim com muita vontade mas sem qualquer talento precoce.

Hora de descer a avenida Itamarati, passar diante do Carrefour -- ali era o antigo clube da Rhodia, frequentado por nossos pais -- e, pelo velho viaduto da estação, ao lado do atual Grand Plaza, ganhar a entrada secundária do Parque Celso Daniel.

Ali mesmo na Industrial, ao lado dos novos hotéis. Onde antes ficavam a General Electric, a Fichet, a IAP, a Copas e tantas outras grandes indústrias que faliram ou se mandaram com o tempo, em busca de privilégios fiscais.

Nosso P-2 é aquele que um dia já foi Chácara GE, Chácara São Luiz e Parque Duque de Caxias. Belo, com árvores frondosas ( incluindo os restos da figueira centenária), cuidado e bem frequentado. São várias opções de pistas, com serragem ideal para minimizar o impacto.

Academia ao ar livre estava lotada. Exceção a dois aparelhos interditados, que serviam de mero apoio para conversas sem fim de quem fingia se exercitar. Parquinho também estava repleto, assim como o campo de futebol do rachão e as quadras externas.

Discretamente, alguns casais de meia idade esperavam o início da concorrida aula de dança. Bem interessante, mas não é o meu forte! Ao lado, as crianças, poucas, tinham como opção as brincadeiras do Expresso Lazer.

Duas voltas, e pé na estrada. Quer dizer, na avenida D. Pedro II. Paço municipal (com pichações inconcebíveis e eternamente sem guardas municipais a protegê-lo), Ramiro Colleoni e avenida Pereira Barreto. Com ninguém é de ferro, um pit stop estratégico no banheiro do Shopping ABC; e chegamos ao Parque Central pela ciclovia.

Antigamente, ali no P-3 havia lagoas naturais, hortas e até criação de gado. Lembro-me de que o curral, onde se tirava o leite, era nos fundos da casa da tia Itália, colado na torre da Eletropaulo e num eucalipto enorme. Volta e meia, quando eu vinha de São José do Rio Pardo, em férias infantis, nossas pipas ali se enroscavam. Olha o perigo da molecagem!

Demos apenas mais uma volta. Suficiente para ver muita criança brincando, poucos pescadores -- por causa do frio, lógico --, vários atletas de fim de semana na pista razoável e um sem-número de cachorros. Alguns puxaram aos donos. Bem mal-educados e sujões.

Não passamos na academia, mas tive tempo de reparar no pintassilgo solitário, no casal de canários da terra, no par de corujas assustadas sobre o cupinzeiro, nos seis quero-queros quietos e fora da área e no bem-te-vi à procura de uma fêmea para fazer a corte.

João-de-barro e sua companheira preferiam a corridinha rápida ao vôo rasante; não se intimidavam com o passa-passa de humanos apressados junto ao segundo lago, onde os biguás se deliciavam com tilapinhas e a garcinha solitária só ficava na sobra. Literalmente, corria e tentava comer pelas beiradas. Deu dó!

De repente, o telefone toca. Não, não era para a pobre garcinha; nem para o preguiçoso socó. Maira, Danilo, Victor e a pequena Júlia nos convidam para comer um cupim "no capricho". Aceitamos, lógico, mas avisamos que nossa meta seria cumprida no Ipiranguinha, ali onde está fincado o Corintinha de tanta tradição.

Um clube histórico, que completa 100 anos em agosto e onde o rei Pelé, a 7 de setembro de 1956, fez seu primeiro gol como jogador do inesquecível Santos bicampeão mundial interclubes em 62 e 63.

Futebol à parte, chegamos ao P-4 rapidinho. Não sem antes comprar o DGABC na banca do seu Zé e da dona Zélia, ao lado de onde já foi a Harmonia. Academia foi nossa por uma década. Muitos alunos e bons amigos.

Entramos no Ipiranguinha pela lateral e notamos, de cara, que na recém-implantada Praça do Exercício do Idoso só havia três pessoas. Um senhor, um adulto jovem e uma criança esperta brincando de trepa-trepa.

Já a academia ao ar livre, lá em cima, estava lotada e desta vez sem aparelhos quebrados. Único alerta é que duas crianças e dois adolescentes arteiros abusavam de um lugar que não é adequado para a idade. Afinal, o velho parquinho está a apenas 10 metros.

Tradicional feirinha (ou feirão?) de artesanato e outros quetais, principalmente tentações comestíveis, tinha bastante gente. Pista para caminhantes e corredores -- como nós -- poderia ser cuidada com mais carinho. Manutenção fica a dever.

Observação pesarosa fica por conta do que, infelizmente, não mais se vê. Há muito tempo, o símbolo do índio já não encabeça, um prédio que já foi posto a baixo. Nem igreja, nem cinema, nem estacionamento.

Pois é... outro cinema de tanta gente (1747 lugares) se foi. O Cine Tamoyo não ficou nem como patrimônio histórico. Virou poeira! Provavelmente, as telas e os atores que nos maravilhavam serão substituídos por centros cirúrgicos, tomógrafos, UTIs, médicos e inúmeros cidadãos em busca de uma saúde menos indecente e irresponsável.

Cumprido o Circuito dos Quatro Parques, devoramos o delicioso cupim ao lado de quem amamos, ali na vila Linda. Após o novo pit stop, esse longo e com direito a caipirinha de limão cavalo e sobremesa, voltamos pra casa, a pé. Quase seis horas depois, cansados, mas sem bolhas. Optamos pela Carijós, para evitar as subidas.

O P-4 foi legal, um desafio cansativo devido ao piso duro, mas compensador! O C-4, nem tanto. Afinal, sem a dignidade da memória, hoje os cinemas de rua de várias gerações de andreenses são apenas saudades. Doces lembranças de tardes de domingo que não voltam mais.

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